Guiné-Bissau: “A Mesa de Bruxelas foi um marco para o país e para a África Ocidental”, disse o embaixador Paulo Cordeiro

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Foto: Guiné-Bissau – Virgínia maria Yunes

Natalia da Luz, Por dentro da África

Rio – Pensando em um futuro de desenvolvimento e estabilidade para o país, a Guiné-Bissau convocou a comunidade internacional para a Mesa Redonda de Bruxelas. O encontro realizado em solo belga, no final de marçoteve o propósito de arrecadar 400 milhões de euros de ajuda para projetos de desenvolvimento, mas acabou somando 1 bilhão de euros, indicando uma perspectiva otimista para o futuro do país. 

– Esse encontro foi uma tentativa de a comunidade internacional não apenas ajudar no desenvolvimento do país, mas de alavancá-lo a partir de um composto de projetos, chamado Terra Ranka que, em crioulo, significa um novo começo – contou, em entrevista exclusiva ao Por dentro da África, o subsecretário-geral para África e Oriente Médio, Paulo Cordeiro, que participou da conferência do dia 25 de março representando o Brasil.

Captura de tela 2015-05-05 às 21.23.06Paulo explica que esse suporte para o desenvolvimento não será em dinheiro, tampouco se converterá em empréstimos de altos juros a serem pagos pela nação africana. Eles chegarão ao país em formato de projetos e programas.

Como esse “recomeço” beneficia toda a região, vizinhos como Senegal, Guiné-Conacri e Gana estiveram ao lado da Guiné-Bissau. Além dos países da África Ocidental, foram à mesa, em apoio ao país africano, os membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).

O documento apresentado reúne recomendações para boas políticas a fim de criar o caminho para reduzir a pobreza e aumentar a prosperidade, identificando quatro áreas de prioridade: fortalecimento do setor público, melhora do fornecimento de serviços públicos básicos, apoio ao relançamento dos setores produtivos e estímulo do investimento privado.

Paulo Cordeiro, Subsecretário-geral para África e Oriente Médio

De acordo com o Banco Mundial, as condições para o progresso e estabilidade são favoráveis. Em 2013, o rendimento nacional bruto per capita no país foi de US$590. Baseada em uma economia rural, a Guiné-Bissau depende de cultura do caju, que é a principal fonte de renda dos guineenses, representando cerca de 90% de suas exportações.

–  O montante acordado ficou em 1 bilhão de euros, que servirão para financiar projetos nas áreas de desenvolvimento urbano, capacitação, agricultura, proteção à biodiversidade, negócios… Será um processo de longo prazo para aprimorar atividades, como o cultivo do caju e do arroz, por exemplo – lembrou Paulo, citando alimentos tão vitais para a economia da Guiné Bissau, país que teve o seu apoio financeiro e técnico suspenso desde o golpe militar de 2012.

Golpe Militar

Em 12 de Abril de 2012, uma ação militar comandada por militares guineenses atacaram a residência do ex-primeiro-ministro e candidato presidencial Carlos Gomes Júnior, presidente do PAIGC. O grupo ocupou pontos estratégicos da capital Bissau, alegando defender as Forças Armadas de uma agressão de militares angolanos, que, segundo o Comando Militar, teria sido autorizada pelos chefes do Estado interino e do Governo.

Em 11 de maio do mesmo ano, Manuel Serifo Nhamadjo, presidente da Assembleia Nacional, assumiu o cargo de presidente interino do país, com mandato para um ano.

O representante da Organização das Nações Unidas (ONU) na Guiné-Bissau, José Ramos-Horta, apelou para uma mudança de comportamento das forças de segurança e militares, no sentido de que haja “paz duradoura” no país. No dia 23 de junho de 2014, José Mário Vaz tomou posse como o novo presidente da República da Guiné-Bissau.

Governo da GuineEsse aporte de 1 bilhão de euros também servirá para aparelhar as Forças Armadas, para combater o tráfico de drogas na região e proteger o país que, geograficamente, está próximo de movimentos radicais que crescem na região, principalmente, em países como Nigéria e Mali.

– A Guiné-Bissau é um país pequeno, mas que chama atenção por conta de ser uma rota para o tráfico de drogas e crime organizado. Os americanos e europeus têm essa ideia de que precisam ajudar a Guiné para evitar isso. A Guiné era vista como um foco de mal-estar na região e agora pode se tornar uma parte importante da solução regional – ressaltou Paulo, completando que o país vem investindo em um bom diálogo com os vizinhos desde o estabelecimento do governo constitucional.

Guiné-Bissau

Foto: Guiné-Bissau – Virgínia maria Yunes

Localizada na Costa Ocidental da África e banhada pelo Oceano Atlântico, a Guiné-Bissau foi a primeira colônia portuguesa na África a ter reconhecida a sua independência. Há 41 anos, em 24 de setembro de 1973, uma nova trajetória começava a ser construída para o país. O país foi palco de três golpes de Estado. O reconhecimento da antiga colônia ocorreu apenas um ano após a declaração de independência, em 10 de setembro de 1974.

Nesse período, acontecia na antiga metrópole a Revolução dos Cravos, um momento da história posterior ao golpe de Estado, de 25 de abril de 1974, que depôs o regime ditatorial do Estado Novo, vigente desde 1933. A derrubada de Marcelo Caetano, sucessor de Antonio Salazar, representava o fim da ditadura.

Em quase todas as colônias portuguesas africanas – Moçambique, Angola, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe e Cabo Verde – surgiam movimentos separatistas, que resultariam, em grande parte, nas guerrilhas armadas.

Relembrando a história 

guine mapNa Guiné-Bissau, antes da chegada dos portugueses e até o século XVII, grande parte do território integrava o reino de Gabu, que se tornou independente após o declínio do Império Mali (1230 – 1600). Além do Mali e da Guiné Bissau, o Império também englobava o Senegal, Guiné, Burkina Faso e Gâmbia.

A colonização teve início em 1558, com a fundação da Vila de Cacheu. A princípio, somente as margens dos rios e o litoral foram exploradas. Mais tarde, no século XIX, os colonizadores partiram para o interior.

Foto: Guiné-Bissau – Virgínia maria Yunes

A Vila de Bissau foi fundada em 1697, como base militar. Posteriormente elevada à cidade, tornou-se a capital colonial, estatuto que manteve após a independência de Portugal.

A tomada de iniciativa da Guiné-Bissau em convocar a Mesa de Bruxelas indica um novo cenário para o país. O embaixador destaca que esse comportamento se dá também porque os projetos foram liderados pelos membros do partido responsável pela independência do país. Um fato importante é que eles levaram deputados do partido de oposição para a mesa, realmente, indicando a tentativa de fazer uma espécie de recomeço do país.

Um recomeço do qual o Brasil também continua a fazer parte. Apesar de não se comprometer a doar nenhum valor durante a Mesa de Bruxelas, o embaixador recordou os projetos de intercâmbio entre os países. Apenas na área da educação, mais de 1.500 guineenses se formaram em solo brasileiro, tanto na graduação quanto na pós-graduação.

– Com a criação da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB), tivemos um aumento significativo de bolsas dadas aos guineneses. Temos investido em projetos escolares e de capacitação. Nos comprometemos a dar continuidade aos esforços que temos feito há 40 anos – reforçou Paulo.

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