África em Verso: ‘Doce Setembro’, por Morgado Mbalate

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Rio Incomáti, Moamba, Moçambique – Registro do leitor Daniel Pinheiro — em Moçambique.

Morgado Mbalate, Por dentro da África

Nasci entre as pernas da dona Palmira

numa madrugada de 6 de setembro de 1993
pela graça de Deus.
No norte do bairro do Fomento,
no sul da Cidade da Matola,
ao som do Afrobeat de Fela Kuti,
a madrugada abriu caminho para que os anjos do céu
tocassem flautas e música africana no jardim de casa.
Os anjos e meus pais escreveram um poema de amor
no mais profundo da minha alma
e cantaram louvores em agradecimento a Deus
pelo nascimento do menino.
Sou fruto da engenharia de Deus,
dos seus mais belos sonhos e pensamentos.
Sou filho da dona Palmira, do suor do senhor Henrique.
Recém-nascido, eu chorava outonos e respirava primaveras.
Batizaram-me com o nome de Morgado.
Passados alguns anos, cresci e ganhei um nome carinhoso de casa, Gadinho.
Assim carinhosamente chamado, meus olhos castanhos cor de mel
tinham luz e brilho que até hoje permanecem.
Meu sorriso brilhava mais que sol de Setembro.
Nasci do útero do rio de Deus, no estômago do corredor de casa,
próximo a boca da varanda, que tem uma vista para o jardim.
Sou um sonhador incorrigível,
meu espírito carrega grandes doses de esperança.
Sou um africano, nascido no mar moçambicano,
numa África dos africanos e não africanos.
Sou um jovem que escreve, luta e sonha viver numa África Africana.
Sou um poeta ambientalista, o meio-ambiente me torna poeta,
e através da bússola da poesia reencontro os sonhos da minha infância.
Sou apaixonado pelo meu país, pela África, pelas causas humanas,
pelo mundo e pelas ternuras da poesia.
A minha força ancestral e a energia do meu corpo caminham de mãos dadas
com a herança e grandeza dos meus antepassados.
Minha africanidade e moçambicanidade
estão presentes em tudo que escrevo.
Sou paisagem desconhecida.

Morgado Mbalate